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Existe por entre os cidadãos uma espécie de mito urbano que faz furor (especialmente entre os mais velhos) que diz o seguinte:
Sempre – mas sempre - que um peão se aproxima de uma passadeira, eis que de imediato surge uma parede invisível que impede que qualquer veiculo impeça os peões de levar a cabo a dita travessia.
Como tal é comum atravessar-se sem sequer ter a veleidade de se olhar para ambos os lados pois pode suceder, por força do acaso, que o incompetente que venha a circular na estrada não consiga travar a tempo. Mas o peão, rei e senhor da passadeira e perfeitamente consciente da existência da tal parede invisível, atravessa de qualquer maneira jeito e feitio, cabendo ao condutor/motociclista/ciclista a obrigação de ter de travar a fundo mesmo que tal coloque em perigo a sua integridade física. E para completar o ramalhete eis que o peão, no alto da sua sabedoria popular, manda umas “bocas” a quem teve de travar de repente por causa da travessia de sua Exc.ª.
Ora tal cenário que descrevo no parágrafo anterior aconteceu-me ontem à noite. Vinha eu de bicicleta na Avenida da França quando opto por virar para a Rua da Graciosa (para que conste a minha bicicleta tem luz atrás e à frente e eu estava com um colete reflector). Sei perfeitamente que na entrada da Rua da Graciosa existe uma passadeira. Abrando a velocidade, sinalizo a minha presença com três ou quatro toques de campainha, deixo passar uma Sra. que se encontrava a iniciar a travessia na passadeira e quando me preparo para iniciar uma pedalada mais forte eis que um casal de idosos se atravessa na minha frente (já eu estava a meio da dita passadeira). Travo a fundo, deixo passar o casal e a mulher, não satisfeita com o susto que me pregou, sai-me com esta linda frase:
- Os ciclistas também têm de saber esperar!
Ao que respondi alto e bom som:
- E os peões não podem atravessar de qualquer maneira! Mesmo numa passadeira!
E bem vistas as coisas a Lei está do meu lado. Senão vejamos o que diz o Código da Estrada sobre este assunto:
Decreto-Lei nº 265-A/2001 de 28-09-2001
CÓDIGO DA ESTRADA
TÍTULO III
Do trânsito de peões
Artigo 101.º
Atravessamento da faixa de rodagem
1 — Os peões não podem atravessar a faixa de rodagem sem previamente se certificarem de que, tendo em conta a distância que os separa dos veículos que nela transitam e a respetiva velocidade, o podem fazer sem perigo de acidente.
2 — O atravessamento da faixa de rodagem deve fazer-se o mais rapidamente possível.
3 — Os peões só podem atravessar a faixa de rodagem nas passagens especialmente sinalizadas para esse efeito ou, quando nenhuma exista a uma distância inferior a 50m, perpendicularmente ao eixo da via.
4 — Os peões não devem parar na faixa de rodagem ou utilizar os passeios de modo a prejudicar ou perturbar o trânsito.
5 — Quem infringir o disposto nos números anteriores é sancionado com coima de 6€ a 30.”
Atente-se o que está escrito no n.º1 do aqui destacado artigo (o que está sublinhado e a negrito) ao qual acrescento o seguinte (que retirei daqui):
Almeida e Silva, jurista do Automóvel Clube de Portugal, explicou ao Jornal de Notícias que “se o condutor deve moderar a velocidade sempre que se aproxima de uma passadeira, prevendo a possibilidade de um transeunte querer passar, quem circula a pé tem o dever de não avançar se a distância a que se encontra dos carros inviabilizar uma travagem segura”.
O especialista do ACP acrescenta ainda que “quantificar esta distância de prudência não é fácil, já que os 100 a 150 metros que geralmente se convenciona como sendo suficientes para uma travagem livre perigos, podem não o ser”.
“Quando há um atropelamento numa passadeira, culpa-se sempre o condutor, mas por vezes a responsabilidade é do peão. Mesmo que se circule a 50km por hora, nem sempre é possível imobilizar o veículo em meia dúzia de metros. À noite ou em condições de luminosidade reduzida, os cuidados devem ser redobrados”, continua Almeida e Silva.
Resumindo e concluindo: o peão nem sempre é o elo mais fraco. É antes, por norma, o elo mais irresponsável com o qual quem circula nas ruas de uma cidade tem de lidar e – sobretudo - aturar.