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A União Europeia, cada vez menos democrática no topo e na base, forneceu a esta conjuntura um instrumento quer de unificação e ampliação de políticas, quer de controlo político sobre os recalcitrantes. O “europeísmo” ideológico, em refluxo de caução democrática nacional e sobrepondo-se, muito para além dos Tratados, aos parlamentos e à soberania, teve um papel fundamental em conseguir a subordinação dos socialistas a essa direita. Esta subjugação foi materializada, entre outras coisas, pelo Tratado Orçamental que lhes impõe uma visão da economia, da sociedade e do estado que historicamente nunca foi sua. A isto somou-se uma interpretação retrospectiva da história, encontrando um nexo causal que demoniza certas políticas e legitima outras. Viveu-se e vive-se um momento áureo de um historicismo vulgar associado à perda de memória acentuada no universo mediático e das redes sociais.
Com a proibição de qualquer veleidade keynesiana pelo Tratado, os socialistas perderam autonomia e sofreram derrotas sobre derrotas, mesmo quando “ganharam” como Hollande, porque entre uma imitação e a “real thing” os eleitores preferem a “realidade”. O preço desta quebra da “alternativa” foi a crise preocupante de representação nas democracias europeias, o crescimento da abstenção, o afastamento dos partidos no poder da população, e o crescimento à esquerda e à direita de partidos e movimentos anti-europeus e anti-sistema. Na “realidade” paga-se sempre o preço da realidade.
Em segundo lugar, existe uma enorme confusão entre a “realidade” do “fim da história” e o poder. Aquilo que os gregos encontraram à sua frente não foi o muro da “realidade”, foi o muro do poder. O poder no sentido weberiano, a possibilidade de alguém obrigar outrem a proceder contra a sua vontade. Uma das grandes aquisições da crise grega para a consciência europeia, foi a revelação às claras, sem ambiguidade, sem disfarces, da brutalidade do exercício de um poder. Nos nossos dias isto não é desejado pelos poderosos, que gostam de disfarçar o seu poder na discrição e no segredo, onde ele é sempre maior. Ao revelar o poder, enfraqueceu-o. Dos alemães aos parceiros menores como Passos Coelho, saber-se o que fizeram, saber-se o que impediram e vetaram, saber-se o que disseram, nas portas fechadas do Eurogrupo, e perceber-se que o resultado foi uma imposição punitiva de uma política em que ninguém acredita a um governo e a um povo, cria uma situação sem retorno.
Excertos de texto de opinião de Pacheco Pereira
Como agora tudo parece ter entrado num conveniente silêncio eis que volto a bater na tecla Grega e do actual estado a que a nossa pobre, muito pobre, Europa chegou. Nunca imaginei que após a 2.ª Grande Guerra/queda dos Regimes Fascistas a Direita extremista voltasse a marchar e a ter a força que tem hoje em dia. Hitler, Mussolini, Salazar e Franco devem andar às voltas nos seus túmulos…
Um aparte, depois de ter visto isto pergunto-me se na Coligação não haverá quem necessite de consultar, e com carácter de urgência, um Psiquiatra e/ou Psicólogo. É que tanta alucinação e mentira são de uma gravidade tal que faz inveja a muitos dos doentes internados no Magalhães Lemos/Júlio de Matos!
Eu sei que está toda a gente farta da Grécia, de ouvir notícias sobre a Grécia, de falar da Grécia. O sistema mediático tem este efeito de rápido cansaço e gera também a vontade de passar para outra coisa ou outra causa. Para além disso, tudo parece já estar decidido e não vale a pena chover no molhado. Vale, vale.
Depois há a sensação de derrota dos filo-helenos, seja dos políticos pró-Syriza, seja dos admiradores mais dos gregos do que do Syriza. Todos partilham uma sensação incómoda porque mistura sentimentos de traição, humilhação, derrotismo, impotência, tudo coisas pouco amáveis para a auto-estima.
Ainda pior é ver a alegria dos que, ao lado de personagens como Dijsselbloem, gozam a sua vingança contra Varoufakis que, de todo não respeitava o holandês pedestre, e contra os gregos que tiveram o arrojo de votar “não”. Digamos que é o clube português dos fans de Dijsselbloem, que festeja a vitória em artigos nos locais certos, nas redes sociais e nos comentários, numa espécie de jogo de futebol contra o clube português dos fans de Varoufakis, no qual, imagine-se a brilhante inteligência, incluem… António Costa.
Senhor, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem. O problema é que sabem: querem manter-se no poder e prosseguir um programa de revanche social e política contra os que desde o 25 de Abril lhes roubaram o direito natural de mandar.
É por isso que me é inaceitável o argumento salomónico que muitos socialistas usam para se justificar, atribuindo “culpas” ao governo grego e à “Europa”, umas concretas e com alvo, as outras abstractas e genéricas, como se o resultado final se devesse ao modo como os gregos se comportaram nas negociações e não à recusa sempre sistemática dos alemães e do Eurogrupo em negociar fosse o que fosse, com o apoio dedicado dos socialistas. Os gregos podem ter feito todas as asneiras possíveis, que isso não justifica o que se passou. Mesmo os meses que durou isto tudo, não foram os meses necessários para negociar qualquer coisa, mas os meses necessários a colocá-los entre a espada e a parede e por fim vergá-los. Nunca, jamais, em tempo algum, poderia ter sido de outra maneira, porque nunca quem manda desejou que fosse de outra maneira.
Muitas das propostas gregas logo de início eram bastante moderadas (recordam-se de como os fans de Dijsselbloem disseram que os gregos tinham vergado como Hollande…), mas a perigosidade evidente de um governo como o do Syriza obter qualquer ganho de causa era inaceitável para governos como o português e o espanhol, e era uma bofetada para os socialistas colaboracionistas. A questão nunca foi conduzir bem ou mal as negociações, mas o facto de, por imposição da Alemanha, se ter sempre decidido que não havia acordo com os esquerdistas do Syriza.
Os alemães e os seus acólitos tinham um programa de humilhação, com um acordo que foi afinal escrito pelo Syriza a branco, para eles o reescreverem a preto. O acordo com a Grécia, na realidade um diktat, só tem uma lógica: obrigar os gregos a engolir tudo o disseram que não desejavam. Não tem lógica económica, nem financeira, tem apenas uma lógica política de humilhação. Querias isto? Pois levas com um não-isto. Foi assim que foi feito o chamado acordo.
E não me venham com o argumento de “confiança”, por parte de governantes como Merkel, Rajoy e Passos Coelho que apoiaram Samaras e a Nova Democracia até ao fim, sabendo que apoiavam um governo corrupto e oligárquico, coisa que o Syriza nunca foi acusado de ser. Esse governo “confiável” literalmente evaporou centenas de milhares de milhões de euros e permitiu que a Grécia, endividando-se até ao limite, funcionasse como tapete rolante para reciclar a dívida dos bancos franceses e alemães para os contribuintes europeus. E não me falem de “confiança” face a um acordo-diktat em que ninguém acredita, em que ninguém “confia” e que assenta no poder e no cinismo.
É uma exibição brutal de poder, que coloca a Grécia a ser governada de Bruxelas e Berlim, por gente que vai decidir os horários das lojas ao domingo, quem pode ter uma farmácia, como funcionam as leitarias e as padarias, e quem pode conduzir ferrys para as ilhas. Mas há mais: são revertidas decisões constitucionais de tribunais gregos e, como em Portugal se fez, mudanças legais para acelerar despejos, expropriações, falências e para retirar aos trabalhadores direitos sindicais e de negociação.
Texto de opinião de José Pacheco Pereira publicado no Jornal Público
O negrito e o sublinhado que vemos no texto de Pacheco Pereira são da nminha autoria. São extractos da realidade que os "pró Alemanha fora do €" e que acham que a Alemanha é a "Dona disto tudo" pretendem ignorar.
Já agora se vos aprouver leiam também o que um antigo Dirigente do FMI disse sobre o último "acordo" Bruxelas/Atenas. Quando um tipo destes mostra ser mais Europeísta que os Europeístas é sinal de que algo está mal... Muito mal!
Amanhã voltamos a falar sobre a Grécia/UE.