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A temática não é nova dado que já aqui a abordei. Contudo volto a ela porque na passada Sexta-feira um grupo organizado de Advogados e Solicitadores protestou em Lisboa diante da Ordem dos Advogados (OA) e Ministério da Justiça por causa do actual Regulamento Contributivo da Caixa de Providência dos Advogados e Solicitadores (CPAS).
E, ao contrário daquilo que muita da imprensa escreveu, a razão do protesto não se prende com o pagamento das contribuições. Muito pelo contrário. Convinha que quem tem o dever de informar se desse ao trabalho – mesmo que minimalista – de ser honesto naquilo que escreve porque o assunto é deveras delicado. E a temática é delicada porque nem todos os Advogados e Solicitadores tiveram a sorte de terem nascido no seio de uma família abastada. Para mais este conceito antiquado de que filho/filha de gente rica é que pode exercer Direito está há muito ultrapassado.
O que move Advogados e Solicitadores contra a CPAS é o facto de que hoje as contribuições são completamente desajustadas da realidade. Para além de obrigatórias, o valor mensal das ditas contribuições é determinado partindo do princípio irrealista de que todos os Advogados e Solicitadores a exercer em Portugal auferem para cima de dois ordenados mínimos. Para a CPAS e Ministério da Justiça parece que se trata de duas Classes Profissionais cujos membros fazem parte de grandes Sociedades onde cobram fortunas pelos seus serviços. Não é bem assim. E é muito por isto que a sustentabilidade da CPAS está actualmente ameaçada por dívidas relativas a contribuições de associados que, em 2017, atingiam cerca de 132 milhões de euros.
E fica mal ao Gabinete de Francisca Van Dunem utilizar os dados que expus no parágrafo anterior para justificar a manutenção e futuro agravamento da situação. E sim, futuro agravamento porque, segundo o actual Regulamento de Contribuições da CPAS, até 2020 o valor das contribuições vai aumentar até perfazer 40% do ordenado mínimo nacional. Não será difícil fazer as contas e verificar quantos terão os Advogados e Solicitadores de pagar todos os meses à CPAS quando em 2020 o ordenado mínimo for de €600.
A agravar toda esta situação temos o facto de que caso o profissional da advocacia e/ou solicitadoria adoeça, este não tem direito a qualquer tipo de apoio por parte da CPAS. A única coisa que tem é a obrigação de pagar a contribuição mensal sob pena de vir a contrair uma dívida crescente para com a dita Caixa de Providência. Isto salvo nos casos em que o profissional seja internado, faleça ou fique venha a padecer de alguma deficiência. Situações extremas em que a CPAS presta algum apoio financeiro ao beneficiário.
Tal estado de coisas não se entende. Especialmente numa altura em que os partidos políticos mais à esquerda se orgulham de tudo fazer para proteger os trabalhadores dos ataques a que foram submetidos durante os anos da Troika. Ainda há bem pouco tempo o Bloco de Esquerda se orgulhava de ter trazido justiça aos Recibos Verdes e de lutar pelo fim da precariedade no trabalho.
E convêm que nós, cidadãos, não nos deixemos levar pelo argumento fácil de que se trata de profissionais liberais até porque já aqui o disse e repito, se foi possível fazer-se justiça nos Recibos Verdes, porque não há de haver também justiça na Justiça?
Artigo publicado no site Repórter Sombra (29/01/2018)
O Governo Passos/Portas tinha como lema o velho ditame “dividir para reinar”. Durante quatro longos anos a legislatura deste Governo foi marcada pro decisões polémicas que para terem menos resistência da parte da Sociedade portuguesa eram tomadas seguindo – à risca – o tal ditame. E em muitos casos com sucesso total pois a divisão era de tal maneira forte que os “dois lados da barricada” acabaram por se aniquilar um ao outro.
Muitas foram as situações em que a dita estratégia foi aplicada, mas aquela que mais mossa fez, faz (e fará caso não se decida fazer nada urgentemente) foi no mundo do Direito. Vamos por partes.
Pouca gente sabe – ou não quer saber – que os Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução que sejam Profissionais Liberais são obrigados a “contribuir” mensalmente para uma Caixa de Providência: CPAS (Caixa de Providência dos Advogados e Solicitadores). As ditas “contribuições” mensais são definidas não em função do rendimento mensal auferido mas sim por um Regulamento que é apresentado pela Administração da CPAS às Ordens destes Profissionais que o debatem, sendo depois alvo de apreciação parlamentar na Assembleia da República antes de serem publicados em Diário da República para poderem vigorar. Até aqui tudo normal.
O problema é que a CPAS a partir deste ano de 2016 decidiu que as “contribuições” passam a ser calculadas – passo a citar - pela aplicação da taxa de 17% (em 2015 e em 2016) a uma remuneração convencional. Trocado por miúdos para que toda a gente perceba; o actual Regulamento da CPAS, aprovado pela maioria PSD/CDS na última legislatura, determina que Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução tenham os valores das suas contribuições de5terminadas em função de uma “remuneração convencional”. Acresce ainda que a esta ““remuneração convencional” será aplicada uma taxa de 19% em 2017, 21% em 2018, 23% em 2019 e 24% no ano de 2020 e seguintes. Os Profissionais destes ramos que porventura tenham assinado um Contrato de Avença “contribuem” para a CPAS e simultaneamente fazem os normais descontos que todos os Trabalhadores fazem para a Segurança Social.
E agora pergunto: O que raio é uma “remuneração convencional” dado que uma tremenda maioria de Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução são Profissionais Liberais que tanto podem facturar num mês 500€ como podem facturar 20€ ou até mesmo nada?
Esta infame situação está a fazer com que muitos Profissionais tenham de deixar de viver para poderem “contribuir” todos os meses com €180,20 (valor mínimo para quem esteja inscrito há 4/ou mais anos na sua Ordem) sob pena de a partir do primeiro dia do mês seguinte ao do seu vencimento às ditas contribuições serem acrescidas juros de mora (para além da perda automática dos parcos - quase inexistentes - benefícios que a CPAS disponibiliza aos seus “beneficiários”).
E tudo isto é assim porque a Administração da CPAS esperou pacientemente pela chegada de um Governo neo liberal como o último de Passos/Portas que teve como alvo o rendimento do trabalho para fazer aprovar em Assembleia da República um Regulamento que hostiliza as gerações actuais de Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução porque – segundo a CPAS – o sistema estava à beira da ruptura porque as gerações anteriores ora suspendiam e retomavam a actividade consoante a sua capacidade contributiva (algo que está vedado á actual geração sob pena de um aumento brutal nas contribuições”).
Quer-me parecer que a ruptura do sistema não está na suspensão ou não da actividade de Advogado, Solicitador, Agente de Execução. O problema está antes na falta de capacidade de quem gere a dita Caixa de perceber que se houver progressividade nas contribuições (contribuições definidas em função do rendimento de cada um e não de uma “remuneração convencional” que ninguém – nem mesmo a CPAS sabe dizer ao certo qual é – o problema da sustentabilidade não ase colocará.
Assim como também me quer parecer que este conflito entre gerações irá levar, mais cedo do que tarde, à real ruptura do sistema porque são cada vez menos os Profissionais das áreas já aqui referidas que conseguirão fazer contorcionismos orçamentais durante muito tempo para poderem ter uma Vida e cumprirem com a sua “contribuição”.
Mas a verdade é que o tal ditame funcionou na perfeição nesta situação. Embora tenham surgido alguns focos de resistência aquando da aprovação do dito Regulamento, o que sucede hoje em dia é que já ninguém quer saber disto. Inclusive já há quem tenha feito saber à CPAS que não consegue contribuir e levado o recado do vá para o desemprego porque dura lex, sed lex.
Artigo publicado no Repórter Sombra