Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




Euro ceguetas

por Pedro Silva, em 10.03.14

O meu mal será o de tentar pautar as minhas intervenções pela sensatez. Não estou com isto a afirmar de forma alguma que por vezes não cometa excessos na defesa da minha visão das coisas, mas uma coisa é certa: não alinho em fanatismos de treta e não caio em esparrelas.

 

Vem isto a propósito daquilo que aqui escrevi recentemente sobre a Crimeia/Ucrânia. Por mero acaso dei com esta Crónica do Jornalista Daniel Oliveira que, tal como eu, é um Homem de Esquerda e um “Europeista” moderado. Deixo-vos aqui alguns excertos da mesma:

 

Em resumo, é isto: os snipers que atingiram mortalmente manifestantes e polícia na Praça da Independência, em Kiev, foram os mesmos e há fortíssimas suspeitas de não estarem ligados ao regime deposto. Pelo contrário, é mais provável que fossem agentes provocadores ligados aos revoltosos. Aquilo que parecia ser uma teoria da conspiração lançada pelos russos ganha assim uma nova credibilidade. Depois de explicar que as balas só podem ter sido disparadas pelas mesmas pessoas, Paet diz a Ashton, sobre a atual coligação governamental: "Há agora um cada vez maior entendimento de que, por de trás dos snipers, não estava Yanukovych, mas alguém da nova coligação".

 

(…)

 

A oposição ucraniana, agora no governo provisório, não é só - nem sobretudo - composta por democratas. A maioria está engajada em partidos tão corruptos e tão dependentes do poder dos oligarcas como o governo deposto. E estes são os melhorzinhos. Os outros, que tiveram um papel absolutamente central na EuroMaidan e na tomada violenta de vários símbolos do poder, estão ligados a organizações bem mais sinistras do que se possa imaginar. O método de eleição de alguns membros do governo provisório, baseado na "democracia de Esparta", pode parecer apenas ingenuidade e anedota. Mas não é. Corresponde a um movimento político antidemocrático que ganhou força nos últimos anos.

 

Vamos então conhecê-los. Um é o grupo paramilitar abertamente xenófobo Pravyi Sektor ("Sector Direito"), herdeiro do "Tryzub" (Tridente) e liderado dor Dmytro Yarosh. Durante a revolução, Yarosh foi acusado de pedir o apoio de Dokka Umarov, líder da fação da guerrilha techechena que está ligada à Al-Quaeda. A acusação está ainda a ser investigada (pode tratar-se duma fraude). Mas a sua organização, bastante violenta, teve um papel central no armamento das milícias paramilitares durante os protestos. Milícias que entretanto foram reconhecidas oficialmente pelo governo provisório. O Pravyi Sektor  prometeu ilegalizar o Partido das Regiões (que estava no poder) e o Partido Comunista. Outro grupo é a Assembleia Nacional Ucraniana-Auto Defesa do Povo Ucraniano (Una-Unso), fundamentalistas ortodoxos, nacionalistas, antissemitas e defensores de um governo autoritário para país. Os seus militantes estão organizados em brigadas voluntárias, com treino na luta da Tchéchénia ao lado dos guerrilheiros.

 

Mas a força política mais importante entre os radicais nacionalistas é, de longe, a União Pan-Ucrâniana "Liberdade", conhecida apenas por Svoboda ("Liberdade"). A Svoboda é assumidamente neonazi e foi fundada em 1991, com o sugestivo nome de Partido Social-Nacional da Ucrânia. Quem não chegue lá pelo nome pode sempre ver o seu símbolo  e ficar esclarecido. Na mesma altura em que várias organizações de extrema-direita do leste europeu fizeram o devido lifting, para estarem em condições de ser apoiadas ou pelo menos toleradas por algumas potências ocidentais, o PSNU foi transformado em Svoboda pelo seu líder Oleh Tyahnybok.

 

O Svoboda é considerado pela Centro Simon Wiesenthal o quinto partido mais antissemita do mundo. É abertamente xenófobo, defendendo a segregação de judeus e polacos. Também é, claro está, homofóbico. O seu deputado Igor Miroshnichenko, assumido admirador de Röhm, Strasser e Goebbels, declarou que "a homossexualidade será banida deste país, pois é uma doença que ajuda à difusão da SIDA". Este mesmo deputado descreveu, na sua página de Facebook, a atriz Mila Kunis (ucraniana de origem, com pai russo e mãe judia) como uma "zhydovka", termo insultuoso para referir mulheres judias. O Svoboda defende não apenas a ilegalização do aborto, mas a criminalização da sua defesa pública. Defende também a ilegalização de qualquer partido comunista, o direito universal a andar armado, o regresso da Ucrânia ao nuclear e o tal "democracia espartana". A tudo isto junta as adesões à União Europeia e à NATO, consideradas absolutamente condizentes com o seu posicionamento político. O que diz qualquer coisa sobre a imagem de exigência democrática que a União Europeia está a passar para fora.

 

(…)

 

Para tentar ganhar votos à muito pouco recomendável mas agora transformada eheroína do Ocidente Yulia Tymoshenko, o não mais recomendável Vicktor Yushenko chegou a dar o título de herói da Ucrânia a Bandera, retirando-o depois de indignados protestos das organizações judaicas internacionais. A mesma União Europeia que agora abraça os pupilos de Bandera condenou, na altura, Yushenko por esta homenagem.

 

(…)

 

Na "heróica" Lviv, onde começou a revolta contra o governo e de onde é o seu líder, os neonazis tiveram mais de 50% dos votos.

 

(…)

 

Depois dos protestos estes grupos quase sem paralelo na Europa Ocidental foram postos à margem? Pelo contrário. O Svoboda tem um dos vice-primeiro-ministros, Oleksandr Sych. O seu cavalo de batalha foi a ilegalização do aborto, mesmo em caso de violação. Quando esta sua posição foi contestada, defendeu que as mulheres "devem ter um tipo de vida que evite o risco de violação, incluindo não beberem álcool e não andarem com companhias pouco recomendáveis". Tem ainda o secretário do Conselho Nacional de Segurança e Defesa, os ministros do Ambiente e da Agricultura e o Procurador Geral da Ucrânia. Isto para além do ministro da Defesa, o almirante Igor Tenjukh, que não sendo militante tem apoiado o partido nas suas iniciativas públicas. Já o Pravyi Sektor  tem o seu sinistro líder, Dmytro Yarosh, como vice-secretário do Conselho Nacional de Segurança e Defesa. E o Una-Unso tem o ministro da Juventude e Desporto e a presidente da Comissão de Anticorrupção Nacional. Ou seja: três partidos à direita do PNR e da Aurora Dourada dirigem, num governo que ninguém elegeu, a Defesa, o combate à corrupção e a Procuradoria Geral. 

 

(…)

 

Perante o crescente poder dos nazis no aparelho de Estado ucraniano, a minoria russa tem boas razões para pensar que não terá lugar nesta nova Ucrânia. Quanto a mim, não sei se me agrada que a Ucrânia do senhor Tyahnybok e do seu Svoboda tenha lugar na União Europeia. Para pior já basta assim.

 

Não preciso de dizer mais nada pois não? Apenas gostaria de perguntar à Sra. Hillary Clinton se da próxima vez quer pensar quatro vezes antes de dizer asneiras em público.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 10:38


5 comentários

Imagem de perfil

De Jorge Soares a 10.03.2014 às 23:15

Pedro


Li o artigo do Daniel Oliveira, que é alguém com quem normalmente me identifico esta vez estou na duvida.


Sabemos que a Europa e os Estados Unidos vão apoiar sempre quem lhe dá mais jeito no momento, mesmo que mais tarde ou mais cedo a coisa descambe, já vimos isso no Irão, no Iraque, no Afganistão.. até o Bin Laden começou por estar do outro lado.


Quanto a mim a questão não é quem são os bons e os maus, a questão é se o povo da Ucrania tem ou não o direito a indignar-se e a tentar derrubar um governo que em contra da sua vontade decide afastar-se da união europeia, União que para esse povo lhes pode trazer um enorme salto em frente.... basta ver o que eram a Polónia e a Hungria antes da união Europeia e o que são agora.


A outra questão é se a Rússia ou outro país qualquer tem o direito de fazer o que está a fazer na Crimeia e o que deve o mundo fazer num caso como este?.


E esta última pergunta deve ser respondida independentemente do que pensamos sobre os bons e os maus da Ucrânia.


Se admitirmos que a Russia pode simplesmente anexar uma parte de outro país porque tem lá cidadãos estaremos a abrir quantas portas? Poderá a Alemanha anexar os cantões Germânicos da Suiça?, poderá a Espanha anexar o País Vasco Francês? No caso da Catalunha se declarar independente a Espanha pode mandar para lá o exército  e voltara  anexar o território porque há lá muitos Espanhois?


Quanto amim não há desculpa para o que se está a passar na Crimeia, há um país que sabe que tem poderio militar para arrasar outro e faz uso desse poderio em quanto o resto do mundo finge que se indigna.... o que será do futuro dos pequenos países como nós se o exemplo pega?


Jorge Soares
Imagem de perfil

De Pedro Silva a 11.03.2014 às 00:07

Grande Jorge temos visões opostas sobre o assunto. Se não te importas vou tentar comentar ponto por ponto o teu ponto de vista.


“Sabemos que a Europa e os Estados Unidos vão apoiar sempre quem lhe dá mais jeito no momento, mesmo que mais tarde ou mais cedo a coisa descambe, já vimos isso no Irão, no Iraque, no Afganistão.. até o Bin Laden começou por estar do outro lado.”


Ou seja, não se apendeu nada com isto e milhares de inocentes tiveram de morrer por causa dos jogos políticos/interesses. Estou farto disto e enquanto puder vou sempre manifestar a minha indignação contra esta burrice selectiva dos políticos,


“Quanto a mim a questão não é quem são os bons e os maus, a questão é se o povo da Ucrania tem ou não o direito a indignar-se e a tentar derrubar um governo que em contra da sua vontade decide afastar-se da união europeia, União que para esse povo lhes pode trazer um enorme salto em frente.... “


Pelo que vejo, lendo e com o conhecimento que tenho do terreno digo-te que não foi de forma alguma o Povo a indignar-se.


Foi um grupo de radicais apoiado por interesses que com as suas promessas foram ganhando força e mais força na Ucrânia. Esta gente não é o Povo Ucraniano. Não representam a maioria dos Ucranianos porque só tem força e presença no lado mais a Ocidente, que por acaso é somente o lado mais pobre e sub desenvolvido da Ucrânia e como tal mais fácil de se manipular porque por lá existem muitos ódios como já tive a oportunidade de explicar no teu blog.


Estes radicais depuseram de uma forma ilegítima um Governo democraticamente eleito porque embora tivessem presença no Parlamento Ucraniano não conseguiram fazer vingar as suas intenções e partiram para a violência para impor um regime que, pasme-se, é formado por neo nazis e radicais de Direita, tendo ficado de fora os Moderados tanto da Direita como da Esquerda.

Imagem de perfil

De Pedro Silva a 11.03.2014 às 00:09

“basta ver o que eram a Polónia e a Hungria antes da união Europeia e o que são agora.”

Histórias e realidades completamente diferentes. Já te tinha explicado isto também. A única semelhança que existirá entre a Hungria e a Ucrânia é o enorme crescimento de grupos neo nazis, ou camisas negras como são conhecidos na Hungria.


“A outra questão é se a Rússia ou outro país qualquer tem o direito de fazer o que está a fazer na Crimeia e o que deve o mundo fazer num caso como este?."”


Kosovo, Iraque e Líbia. Todos Países que viram a sua soberania posta de lado em nome da “Democracia” (entenda-se caça ao petróleo e provocações).


E como reagiu o Muno? Com a hipocrisia habitual. Como disse José Rodrigues dos Santos no telejornal; o Ocidente abriu a caixa de Pandora e agora quem é este para chamar a atenção á Rússia? Ninguém!


E eu já disse aqui no Blog porquê razão acho mil vezes preferível que a Crimeia seja anexada pela Rússia do que ficar sob a alçada de uma Ucrânia que caminha a passos largos para um Regime Nazi com a protecção e apoio do Ocidente.


“Poderá a Alemanha anexar os cantões Germânicos da Suiça?, poderá a Espanha anexar o País Vasco Francês? No caso da Catalunha se declarar independente a Espanha pode mandar para lá o exército  e voltara  anexar o território porque há lá muitos Espanhois?”


Nos casos que apostas não há petróleo, nem gás e muitos menos a possibilidade de se “matar” um País que incomoda o Ocidente como é o caso da Federação Russa. Como tal acho que não poderão ser aplicados ao caso em análise.


“Quanto amim não há desculpa para o que se está a passar na Crimeia, há um país que sabe que tem poderio militar para arrasar outro e faz uso desse poderio em quanto o resto do mundo finge que se indigna.... o que será do futuro dos pequenos países como nós se o exemplo pega?”


É a tua opinião. Tem o meu total respeito mas discordo totalmente dela. Não terei intenção alguma de te demover nem sequer quero tentar fazer tal coisa. Só lamento que quando é o Ocidente a fazer algo de parecido, com ou sem armamento, não há crise, mas quando é a Rússia é o aqui del rei que vem ai o papão.


E mais te digo com a maior das certezas que ninguém quer saber do nosso Portugal para nada porque não temos mais nada senão chatices, péssimos políticos e dívidas Image

Imagem de perfil

De Jorge Soares a 11.03.2014 às 00:41

Pedro, dificilmente podes saber qual a minha opinião sobre os casos do passado, não é deles que estamos a falar, e não me parece que tenha escrito em algum lado o que penso... acho que ficarias surpreendido.


Infelizmente o que tenho visto e lido é que as pessoas se aferram à ideia de esquerda e direita para defender um ou outro lado, eu tento sempre colocar-me do lado da justiça, independentemente do lado que ela vem... o facto do novo governo da Ucrânia ser de direita e o da Russa ser supostamente de esquerda, não me fará nunca esquecer que a Crimeia é parte da Ucrânia e que o que está a acontecer é uma invasão e anexação de uma parte de um país por parte de  outro.... se isso de algum ponto de vista é aceitável, eu de certeza não vou partilhar esse ponto de vista nunca.


Sobre o facto do novo governo ser de direita,... acho que li algures que vão haver eleições na Ucrânia, de certeza que o povo saberá nessa altura escolher o que é melhor para si... 


Jorge
Imagem de perfil

De Pedro Silva a 11.03.2014 às 01:09

Jorge é por causa destas coisas que eu não tenho uma grande apetência para debater numa caixa de comentários.


Não está aqui em causa o facto de um lado estar um Regime de Direita e do outro um de Esquerda. Para mais um Regime Nazi não é de nenhuma facção a não ser da estupidez militante.


Está somente em causa que quando é o Ocidente a marchar sobre a Soberania de um País não haver problema, nas quando é algo com o qual o Ocidente não alinha é mau porque é mau,


A Crimeia nunca foi totalmente da Ucrânia. Este é um erro de propaganda que o Ocidente insiste em promover para manter os cidadãos do seu lado.

A Crimeia é uma República com uma bandeira, Parlamento e Constituição própria que era autónoma e gerida pela Ucrânia a pedido da ex-URSS. Um pouco como Macau há uns anos atrás. Agora vai ser anexada, e bem a meu ver, pela Federação Russa como é a sua vontade.


Para mais o que está aqui em causa é algo de maior dimensão que isto. É uma questão de sobrevivência como já aqui escrevi.


E sim, vão haver eleições na Ucrânia. Mas queres apostar comigo como os radicais neo nazis que estão agora no Poder não vão sair de lá a bem?

Tenho a certeza de que vou ganhar esta aposta Image

Comentar post



Mais sobre mim

foto do autor


Pesquisar

  Pesquisar no Blog

A Oeste nada de novo


Dia do Defensor da Pátria


US War Crimes


Catalunya lliure!


Calendário

Março 2014

D S T Q Q S S
1
2345678
9101112131415
16171819202122
23242526272829
3031

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2016
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2015
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2014
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2013
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2012
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D